Disseste que se tua voz...
Ricardo me perguntou se eu havia tirado férias do Blog. Não, não foi isso... Abro este espaço todos os dias, olho para ele e me pergunto se existe algo dentro de mim que seja legal o suficiente para ser postado. Estes dias tudo aconteceu numa progressão fulminante. Eu fui da felicidade ao abismo em questão de horas. Se isso é motivo para as pessoas abrirem seus blogs e escreverem, comigo ocorre o oposto, eu fico muda, travada, pétrea. Incapaz de digitar um pensamento sequer.
Sento sozinha em algum canto da casa e escrevo cartas para as pessoas. Algumas vão pelo correio, outras via e-mail, outras eu escrevo apenas dentro de mim enquanto fito o teto do quarto. Já perdi as contas das cartas escritas que nunca tomaram forma no papel e que jamais chegarão aos seus destinatários. Nem eles sabem que elas foram escritas e com o tempo nem eu mesma lembro o que escrevi. Hoje mesmo rasguei uma carta escrita desde março. Ao reler achei tudo tão vazio e irrelevante e por respeito ao destinatário encaminhei seus restos ao cesto do lixo. Não me arrependo.
A lua a esta hora deve estar tomando seu caminho para o eclipse. Aqui está tudo em um cinza tão denso que não se consegue ver qualquer pedaço do céu. Seria uma bela metáfora para os últimos dias. Se a chuva que está caindo for uma metáfora para as lágrimas, então eu tenho muito que chorar...Choroterapia, como diz um amigo meu, é bom de vez em quando. Principalmente quando a gente se depara ao longo do caminho com situações que colocam nossa fé a prova, e parecem querer promover a ruptura de nossas bases, de nossos sonhos, daquilo que ainda nos mantêm vivos.
Quando se passa muito tempo sem sonhar, sem fazer planos, sem projetar coisas a longo prazo, sem querer se comprometer com nada, a gente pensa que perdeu a capacidade de fazer isso. De repente, não mais que de repente eu me vi sonhando de novo, projetando de novo, querendo estabelecer ligações mais fortes com as coisas sem medo e ao menor sinal de confiança que eu dou ao meu destino vejo que já existem alguns pontos de descontinuidade e fico pensando se eu vou ter que passar o resto da vida sendo chamada de menina ingênua de visões românticas. Oras, será que ninguém leu O Pequeno Príncipe na vida?
Será que eu vou ter que gastar todos os centavos que eu pegar em mãos para dar esse livro de presente para as pessoas e dizer para elas na dedicatória que o mundo não é essa coisa cética e ríspida que as sociedades industriais fazem parecer? Será que ninguém mais acredita de verdade em coletivismo, em sair da toca e fazer as coisas porque elas podem dar certo e não porque elas são mais fáceis? Será que todos seremos como os habitantes dos planetas que o principezinho visita? Sozinhos, porque não conseguimos conviver com as idéias dos demais?
O que mais me revolta nisso tudo é que se não interferissem no meu projeto de agregar pessoas que pensem desta mesma forma seria ótimo. Mas não, todos os dias eu me deparo com seres que ficam minando os meus planos e desestimulando os demais. Covardia. Então, minha mente entra em ação para depurar os efeitos maléficos destas atitudes. Passo o dia inteiro pensando...penso tanto que acabo não fazendo quase nada e amargo uma sensação terrível de culpa depois por não estar produzindo. E tenho tanta coisa para fazer...ainda restam 25 dias de aula até as férias...
Se eu tivesse uma quantidade de grana legal daria um jeito de juntar em um lugar todas as pessoas que eu conheci nos últimos anos e que compartilham deste sentimento. Queria muito desenvolver um projeto com elas. Me sentiria muito diferente, mais feliz, menos impotente e pelo menos, por um tempo, poderia respirar tranqüila...
Vai uma musica da Legião, que eu gosto muito e me lembro dela sempre nestes momentos...
:: Há Tempos ::
(Letra: Renato Russo)(Música:Dado Villa-Lobos/Marcelo Bonfá/Renato Russo)
Parece cocaína mas é só tristeza, talvez tua cidade
Muitos temores nascem do cansaço e da solidão
E o descompasso e o desperdício herdeiros são
Agora da virtude que perdemos.
Há tempos tive um sonho
Não me lembro não me lembro
Tua tristeza é tão exata
E hoje em dia é tão bonito
Já estamos acustumados
A não termos mais nem isso.
Os sonhos vêm
E os sonhos vão
O resto é imperfeito.
Disseste que se tua voz tivesse força igual
À imensa dor que sentes
Teu grito acordaria
Não só a tua casa
Mas a vizinhança inteira.
E há tempos nem os santos têm ao certo
A medida da maldade
Há tempos são os jovens que adoecem
Há tempos o encanto está ausente
E há ferrugem nos sorrisos
E só o acaso estende os braços
A quem procura abrigo e proteção.
Meu amor, disciplina é liberdade
Compaixão é fortaleza
Ter bondade é ter coragem
E ela disse:
- Lá em casa têm um poço mas a água é muito limpa.