Finalmente devolvi o livro do tio Formiga. Em meados da década de 1990, ele havia me emprestado O Livro de Areia, de Jorge Luis Borges, durante uma festa que acabou se transformando em conversa filosófica, quando ele, Barbie e Victor – na época, um menininho – ainda moravam em um prédio antigo, no bairro das Graças. No entanto, aconteceu algo engraçado: ele não me deu bronca, nem reclamou pela demora – afinal de contas, eu passei dez anos para devolver o livro.

Barbie não conseguia se controlar, rindo da minha expressão boba. Deinha me olhava dizendo: “não acredito, é o livro? Tu devolveu? Não acredito!”. Nem eu acreditava. Pena que ontem o meu computador não pegou e não consegui acessar a quarta edição do Rabisco, em 2002, para imprimir uma cópia do texto para dar ao tio Formiga, junto com os livros. Eu publiquei na Aquarela, sob o título de Tempo de Jorge, Morada Minha. Lembro que, no dia, eu estava com muita febre e sem idéias para a coluna, então, em meio aos meus devaneios, decidi escrever isso. Marcio e Marcel, editores, na época, adoraram.
Eu fiquei super feliz e sinto falta dos tempos em que eu escrevia textos assim...será que a criatividade é algo que passa (risos)? Eu não sei. Meus textos não são mais os mesmos e eu sinto que eles estão ficando mais frouxos a cada dia. Será falta de leituras mais específicas ou sou eu que não ando me permitindo certas revelações? Essa reflexão não tem nada a ver com a história de O Livro de Areia, Borges, tio Formiga e devoluções, mas brotou neste momento e aqui ficará como registro deste instante, como diz Caio Fernando Abreu no texto “Lixo e Purpurina”, que foi publicado no Ovelhas Negras, pela L&PM.
Ah! e Caio...
Bom, para terminar, como acabei falando de Caio, que é fantástico, deixem-me contar que passando rapidamente pela Livraria Cultura hoje de noite, descobri que a Editora Agir relançou o Morangos Mofados. Quando vi o livro, novinho, recém colocado na prateleira, entrei em estado de transe. Perguntei o preço (29,90) e fiquei sonhando com a hora de comprar um para mim.

O Morangos Mofados era uma das únicas obras dele, junto com Os Dragões Não Conhecem o Paraíso (meu livro predileto), que não se encontrava com facilidade em lugar nenhum. Eu e Amigo Con batemos livrarias e sebos em Recife e São Paulo, vasculhamos Internet afora e nunca encontramos estas obras para vender, e agora a Agir está relançando. O autor desta iniciativa merece um Nobel.
Se a editora relançar Os Dragões eu não terei palavras para agradecer, pois, ainda não fiz uma proposta indecente de troca da obra na biblioteca que eu sei que tem porque sou a favor de que todos leiam Caio Abreu, mas que deu vontade, isso deu. Por sinal, lembrando a postagem de ontem, sobre a canção do Paulinho Moska, achei um complemento para os versos que citei em um trecho de “Lixo e Purpurina”. A letra da canção diz:"antes de te reencontrar, sei que preciso voltar a ser alguém”. Então, Caio escreveu isso:
“quero inaugurar meu novo estar-dentro-de-mim ao teu lado (...). Vem para que eu possa recuperar sorrisos (...), rezar, gritar, cantar, fazer qualquer coisa, desde que você venha, para que meu coração não permaneça esse poço frio sem lua refletida”.
“Lixo e Purpurina” – Caio Abreu – Ovelhas Negras – Página 101.
Eu preciso dizer que me derreti?
Aproveitem! Aproveitem! Leiam Caio e Borges, também. Eles são maravilhosos.