...mas as abordagens, quanta diferença...
Eu acho que vale a pena comentar isso:
Esta semana o Jornal Nacional divulgou matérias sobre o recente protesto dos estudantes franceses que estão lutando contra um contrato polêmico que envolve o primeiro emprego e que, de acordo com o movimento estudantil francês, prejudica jovens com idade inferior a 26 anos de idade.
A questão que quero tratar aqui é justamente sobre a cobertura da imprensa. Vamos ao texto da matéria veiculada no dia 16 de março:
Matéria 1
Colegiais e universitários se uniram para protestar. Nas ruas de Paris, 120 mil jovens contra a lei do primeiro emprego, aprovada na semana passada pela assembléia. Era uma jornada de manifestações pacíficas.
Mas no ponto final da passeata, o clima mudou radicalmente. Segundo as autoridades francesas, 300 jovens baderneiros, que não fazem parte do movimento estudantil, incitaram o ataque aos policiais. A partir daí a confusão se espalhou. Clima de muita tensão, as pessoas jogaram tudo o que tinham pela frente: garrafas, pedras e os policiais reagiram com gás lacrimogêneo.
Mas a polícia precisou agir com maior rigor depois que alguns jovens botaram fogo numa banca de revistas.
A um quilômetro dali, nova onda de violência: agora na frente da Sorbonne, a universidade que tem sido o centro dos conflitos entre estudantes e a polícia.
O primeiro-ministro já se dispôs a negociar, mas, até lá, a ruptura entre o governo e a juventude está longe de ser resolvida pelo diálogo.
Fonte: http://jornalnacional.globo.com/Jornalismo/JN/0,,AA1157993-3586-429484,00.html
Agora, vamos ler o texto da matéria do dia 18 de março:
Matéria 2
Estudantes, sindicalistas e representantes da oposição foram às ruas contra a lei do primeiro emprego, que facilita a demissão nos dois primeiros anos de contrato.
O governo abriu caminho para o diálogo e teve o presidente da República, Jacques Chirac como porta-voz para essa proposta em um pronunciamento pela TV ontem. Mas os manifestantes não queriam tomar qualquer decisão antes da passeata de hoje. Para dialogar nos gabinetes, eles queriam primeiro mostrar a força do movimento nas ruas.
Um milhão de pessoas mobilizadas na França - resultado comemorado pelos organizadores. Eles lamentaram apenas a ação de um pequeno grupo que enfrentou a polícia e queimou um carro no fim da manifestação em, Paris.
Entre poucos baderneiros e muitos manifestantes, fica a mensagem para o governo.
Fonte: http://jornalnacional.globo.com/Jornalismo/JN/0,,AA1159450-3586,00.html
É interessante observar aqui a diferença entre a cobertura feita pela imprensa de protestos feitos no Brasil e no exterior. Na França, segundo as informações apuradas pela imprensa brasileira, os 300 jovens que jogaram pedras e atacaram os policiais não eram do movimento estudantil. Ou seja, no Movimento Estudantil Francês não existem baderneiros, como parte da mídia insiste em chamar os estudantes brasileiros que organizaram os protestos contra o aumento das passagens nos últimos meses.
Na segunda matéria, o repórter enfatiza que os estudantes não quiseram dialogar com o governo francês para fazer uma grande passeata e mostrar sua força nas ruas. Se isso fosse feito aqui no Brasil, logo os estudantes seriam chamados de arruaceiros e acusados de querer atrapalhar a rotina da população, enquanto o governo pedia misericordiosamente para fazer um acordo.
A juventude na França protesta porque é consciente. No Brasil, ela é tratada como perturbadora da ordem pública. Se alguém entra em confronto com a polícia na França, é elemento externo ao movimento. Aqui depredadores e não depredadores são farinha do mesmo saco, marginais, que vão para a delegacia, são fichados e humilhados. Na França, o governo abre diálogo para solucionar o problema. No Brasil, o governo manda reprimir “para ensinar que não se faz protesto”.
Que diferença, hein?
**Eu falei a respeito dos textos das matérias do Jornal Nacional, porque foram os que eu vi e uma quantidade maior de pessoas comentou sobre eles comigo esta semana, mas se vocês procurarem no UOL e em outros jornais, os textos tratando dos protestos na França têm o mesmo tipo de abordagem. Para ver a diferença com a cobertura dos protestos brasileiros, vejam o Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio dos dias 18 e 19 de novembro de 2005.