De dentro...
Meus olhos têm telescópios
espiando a rua,
espiando minha alma
longe de mim mil metros.
(João Cabral de Melo Neto - Pedra do Sono)
Dormi umas cinco horas e acordei com a sensação de medo de ficar presa em alguma coisa. Em seguida, recordei que fiz muitas fotos com molduras de grades, ontem à tarde, e fiquei pensando se existe alguma metáfora envolvida nisso, se estou me sentindo enclausurada ou algo similar, porque tenho sempre recorrido a este tipo de detalhe fotográfico. Uma vez, Bione me disse que se pode ver muito do que uma pessoa sente pelas fotos que tira e citou um amigo que constantemente fotografava grades e similares. Ela nem sabia, mas, na hora, lembrei de mim. Depois esqueci...
Agora, acabei reatando esta linha de pensamento porque ando acompanhada por um medo surreal. Não sei se é efeito dos vinte e nove anos de idade, mas, de repente, aquela sensação de que tudo pode acontecer foi substituída pela certeza de que as coisas estão sempre no limite da existência, e isso tem me angustiado. Não sei se é porque Dora partiu na semana passada, a mãe de um amigo está com câncer e ontem fez dezessete anos que uma bala perdida matou meu primo-irmão, mas eu não estou no que dizem que é minha condição natural. Ou seja, plena em sorriso.
Fico me perguntando se vou recuperar minha serenidade. Se vou dormir sem medo da noite e acordar sem medo do dia. Queria sair dessa sintonia com a perda (da liberdade, do amor, da companhia, o que for) e ajustar minha freqüência em algo mais ameno, alegre. É estranho porque volta e meia eu estou com a mesma sensação. Acho que escrevi algo parecido com isso há alguns meses, quando não conseguia dormir. Acho que tenho corrido muito e conversado pouco com as pessoas. Talvez essa inserção direta na roda-viva é que esteja me deixando assim, no limite, na corda bamba da tensão-angústia-ansiedade-medo.
Então, vem aquela musiquinha do Pato Fu: “penso outra vez / estou sem meus amigos / e retomo a porta aberta dos perigos / Na verdade continuo / sob a mesma condição / distraindo a verdade / e enganando o coração”. Não que esteja sem meus amigos. Eles sempre estão por perto, velando o meu silêncio. Por aqui é que está faltando a ternura, os momentos de não pensar em trabalho. Isabella me escreve dizendo que está com saudades e eu penso no quanto sou ingrata porque não retorno contando as novidades. Nem sei quando foi a última vez que falei com meu irmão-amigo Marcelo, em São Paulo; nem quando procurei saber se Victor estava bem. Taciana e Carol querem me ver e não consegui marcar com nenhuma das duas até então. Carol ainda fez a maldade de me lembrar das nossas conversas na calçada, há uns seis anos, quando eu ainda sonhava em ser engenheira e ela não era mãe de Beatriz, que eu nem conheci ainda.
O bom é que lembrar disso afugentou um pouco a angústia com que eu comecei esta postagem. Estava tomada de medo. Agora está passando. Espero que se dissipe ao longo do dia, para todo sempre. Amém. Talvez eu precise rezar, como diz minha mãe, e ver as pessoas que eu amo sem tanta pressa, e abraçar muito todo mundo. E ficar ali abraçado até tudo isso passar e a gente recuperar a fé na eternidade das coisas, do amor principalmente, que vai se perdendo nessas pequenas ranhuras que a gente insiste em criar na vida. Eu devia escrever mais neste blog, como fazia antes. Não sei nem com quem estou falando, mas sempre que termino uma postagem, sinto uma sensação de cura.