Acho que eu fui a única petista que ficou em casa e não comemorou a eleição. Eu não comemorei porque até então eu não estava certa se os petistas continuavam sonhando ou se já tinham colocando o pé no chão. Não que sonhar com um país melhor não seja bom, porém, a situação atual demanda atenção. As pessoas estavam se comportando como as beatas diante do fenômeno das santas na janela, ou seja, completamente embevecidas, sem realizar nenhum tipo de questionamento a respeito das dificuldades que serão enfrentadas por Lula a partir de agora. Mas graças a Deus o presidente eleito tratou de colocar freios em seu discurso hoje a tarde e reiterou o que disse no programa especial, na noite de hoje, no Jornal Nacional. Lula colocou, com todas as palavras, que nada acontece como um passe de mágica e que o processo de mudança começará a ser construído no primeiro dia de 2003. Prestem atenção: é um processo de mudança! Todo processo demanda tempo, planejamento, escolha, e superação de obstáculos. Digo isso com toda essa ênfase porque o brasileiro é o povo mais paradoxal que se pode conhecer: demora a mudar e quando muda quer tudo em um segundo.

Exponho esta questão por uma situação que ocorre aqui em Recife: o prefeito João Paulo desde que assumiu vem realizando diversas obras e projetos de melhoria na cidade e o pessoal diz que ele é um mau prefeito e não faz nada. E as reclamações são sempre do nível: “eu votei nele e ele não fez nada pelo por mim”. É engraçado, o prefeito só é bom quando faz algo pelos nossos umbigos. Se o prefeito evita que pessoas morram em desabamentos, faz obras para acabar com os engarrafamentos nas principais vias da cidade, promove projetos para tirar mendigos de debaixo das marquises das lojas, investe na capacitação dos professores e na melhoria das escolas, ele não faz nada. Se ele tapar um buraco na sua rua, colocar umas arvorezinhas e pintar o meio fio, aí ele é um prefeito excelente, não é? Prefeito agora tem que fazer papel de engenheiro, senão não presta. É a péssima herança de Maluf, em São Paulo, e Jarbas, em Recife, de que prefeito bom é aquele que constrói, constrói, constrói.

Então, com relação à presidência é bom acordar, porque as coisas não serão feitas em um segundo. Não se constrói uma nação que passou 500 anos sendo estragada em apenas quatro anos. E tem outro fator importante: não se constrói um país justo com uma população acomodada. Se é pra ficar sentado em casa falando mal de qualquer coisa que o presidente fizer, era melhor nem ter comemorado. Eu quero ver se o brasileiro terá, durante os quatro próximos anos, disposição para mudar o país na mesma proporção que teve ao acordar de madrugada para ver a copa e ao comemorar a vitória de Luis Inácio na noite passada. Construir um país melhor significa dar uma parcela de si também, significa, para começar, procurar saber o que tem sido feito até agora, para entender as dificuldades que Lula enfrentará e conseqüentemente compreender por que ele não fará milagres em quatro anos.

Não duvido do emprenho do meu conterrâneo e muito menos de sua excelente equipe, mas o Brasil está no fundo do poço, e Regina Duarte vem falar de “medo de perder a estabilidade”. Que estabilidade? I dólar valendo 4 reais. O pão francês custando 0,20 centavos. A gasolina quase 2 reais o litro. Mensalidades de escolas particulares custando um salário mínimo. Quem tem estabilidade? Eu não tenho. Agora mesmo o pessoal na universidade está fazendo campanha de “aumento zero”, porque se continuar do jeito que está daqui há dois anos ninguém mais consegue pagar. Então, como é que alguém abre a boca para falar de estabilidade? Tem – se estabilidade para alguns setores sociais, mas a maioria da população não sabe na prática o que é isso. Estabilidade é algo bem diferente de comprar uma TV e pagar em 13 vezes, e comer frango todo dia – que agora nem dá mais, por que o frango está custando quase o triplo hoje do que custava no começo do plano real.

E tendo uma situação como esta, as pessoas votam e despejam todas as responsabilidades do futuro do país nas mãos do presidente, com a desculpa ridícula de que “se ele não fizer, ele sai”. Sim, ele sai. FHC está saindo e deixando um saldo horrendo para o país. A culpa é nossa. Nós não somos vigilantes, reclamamos da situação do país para o vizinho e não mexemos um palitinho nem para procurar saber o que tem sido feito com nosso dinheiro. Há até quem nem goste de discutir política. Tem gente que diz: “ah! Mas eu faço a minha parte pagando impostos”. Ótimo. Mas tem alguém fiscalizando para onde foi o dinheiro dos impostos? E das privatizações? E os empréstimos do FMI? Paul O´Neil – que esclareço logo que não morro de amores por ele - tem, de certa forma, razão em dizer que é bom que os empréstimos feitos ao Brasil não parem em bancos na Suíça. E eu diria que é bom que o brasileiro comece a se perguntar para onde ele está indo, porque FHC cortou as verbas sociais para investir em outros setores e segurar a economia e ninguém viu. E o mais triste é que xingamos os políticos diante do guia eleitoral e elegemos as mesmas figuras para continuar no poder. Que diabos Roriz está fazendo de novo no Distrito Federal? E a trinca de senadores que representa o nosso estado em Brasília? Alguém aqui já viu a lista de senadores eleitos? Meu Deus, o que é aquilo?

A única coisa que desejo a Lula é muita sorte, porque ele vai pegar um país quebrado, com uma população inerte e descompromissada, e uma direita oposicionista LOUCA para voltar ao poder. É receita para deixar qualquer um realmente sem dormir e afirmando coisas como: “Se alguém falhar, não tem problema. Mas se eu falhar, eu sei o que vai acontecer comigo”. Ele tem toda razão. Boa Sorte, amigo Lula, que dessa vez a viagem em um pau – de – arara não terá 13 dias, mas sim quatro anos.