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sexta-feira, fevereiro 14, 2003

Bienal da UNE: Último Dia

TERMINOU!!! QUE ALÍVIO...

Para quem está cansado de ver o tópico “Bienal da UNE”, fique feliz! Hoje foi o último dia. Eu também fiquei muito feliz de ter sido hoje o último dia, embora tenha aprendido diversas coisas, conhecido pessoas novas, reencontrado muitas outras, dançado muito maracatu e frevo e visto muitas manifestações culturais de vários estados no hall do Centro de Convenções de Pernambuco!

A questão é que foram sete dias de evento e na maioria deles eu passei mais de doze horas correndo de oficinas para palestras, vendo eventos, enfrentando quase três horas diárias de ônibus para ir e voltar, dormindo seis horas por dia e carregando uma mochila de mais de três quilos nas costas, com todo o aparato de sobrevivência mais o material que era distribuído diariamente. Foi uma verdadeira maratona.

Sem contar com o fato de que semana que vem terei que arcar com a responsabilidade de ter faltado uma semana inteira de aulas na faculdade. É muito pouco provável que a coordenação nos dê abono de faltas por estarmos no evento. Mas mesmo assim, quando fiz a escolha pela Bienal estava consciente do ônus que esta escolha me traria. Mas o bonde continua andando. Vamos lá!

COMUNICAÇÃO POPULAR 2

O curso de Comunicação e Cultura Popular nos agraciou hoje com um exemplo de tv comunitária itinerante. Dentro do meio jornalístico alternativo possivelmente alguém já tenham ouvido falar da TV VIVA, uma iniciativa pioneira na América Latina que se caracteriza por ser uma tv a céu aberto, ou seja, de produções feitas na rua e exibição idem.

O projeto que vimos hoje ligado a TV VIVA chama-se TV Matraca. Ele se caracteriza pela produção de documentários feitos em bairros do Recife sobre a história, a produção cultural e a vida cotidiana destas localidades. Cada mês um bairro é documentado e durante o mês seguinte o resultado do trabalho é mostrado em trinta e quatro bairros do Recife em praça pública para os moradores. Isso tem ajudado as comunidades a tomarem conhecimento de si mesmas e do que é produzido em outras partes da cidade.

Particularmente, eu fiquei muito tocada pelo resultado do projeto. Acompanhava a TV VIVA desde pequena, quando havia exibições públicas de outros trabalhos deste grupo no bairro em que moro e meus pais nos levavam por achar extremamente importante que nós tomássemos conhecimento de formas alternativas de comunicação. Não por acaso eu escolhi este mini-curso para fazer.

Porém, eu pensava que iriam ser trazidas diversas outras formas de mídias alternativas que ajudassem na divulgação da cultura produzida pelo povo, além das rádios comunitárias e da tv itinerante. Até porque eu não enxergo a produção cultural da forma que os cadernos de cultura da grande mídia hoje colocam, ou seja, música, cinema, literatura, televisão e teatro. Cultura é tudo o que é produzido pela sociedade, então isso engloba uma fronteira maior que a voltada para o prazer das horas vagas. É uma pena não termos ido além neste curso, a alternativa é garimpar.

MARACATU E FREVO

O último dia da Bienal foi fortemente marcado por manifestações culturais pernambucanas. O stand da Prefeitura do Recife foi providencial ao abrigar uma orquestra de frevo que por cerca de uma hora animou gregos e troianos. Alguns bailarinos da terra mostraram um pouco do seu talento com os passos e a sombrinha, mas a maioria do público pulava mesmo, independente de saber frevar ou não. É interessante observar que algumas pessoas de outros estados, mesmo sem ter tido um contato prévio com as danças locais, mostravam desenvoltura ao dançar e se arriscavam a aprender mais um pouquinho nas aglomerações que se formavam a cada instante pelo Centro de Convenções.

A loucura dos pernambucanos é ouvir a melodia do frevo Vassourinhas ou do frevo Olinda N.2, que é famoso pelo refrão “Olinda! / Quero cantar / a ti / esta canção / teus coqueirais / o teu sol / o teu mar / faz vibrar meu coração / de amor / a sonhar / minha Olinda sem igual / salve o teu carnaval”. É impressionante como o pessoal vibra e eu junto, é claro!

Apesar de não nutrir muito amor pelo que tem sido o carnaval de Olinda nos últimos anos, eu não posso deixar de afirmar que os frevos, maracatus e caboclinhos deixam minha vontade de brincar os quatro dias a flor da pele. Aproveitei, então, pra dançar bastante hoje, porque os treze dias de carnaval que Recife terá eu passarei bem longe dos focos de folia.

CAFÉ LITERÁRIO

Ainda não havia dedicado nenhum espaço ao Café Literário. Ele foi, de longe, o melhor espaço da Bienal da UNE. Totalmente providencial. Contava com um local agradável dentro do Auditório Tabocas, com ar condicionado, boa comida, acesso à internet, exposições de projetos literários e científicos, além dos recitais de poesia, lançamentos de livros e um espaço destinado a apresentações de diversos artistas. Era o refúgio perfeito para quem queria um pouco de paz no meio de tantos transtornos.

TRANSTORNOS DA BIENAL

Se a Bienal teve algo em excesso foram transtornos. Apesar da reclamação do pessoal do MAR.UAI no começo da semana e dos contínuos protestos dos estudantes, a organização do evento parece não ter tomado providências com relação ao problema dos banheiros nos alojamentos coletivos. O pessoal reclamou a semana inteira da falta de higiene e principalmente de apoio nos pontos de descanso.

Outra reclamação constante foi com relação à saída de ônibus dos alojamentos para o Centro de Convenções. Alguns participantes da oficina em que eu estava colocaram que muita gente havia vindo para o evento com o intuito de se divertir e curtir a cidade, então, muitos estudantes iam a praia pela manhã e aqueles que estavam interessados e precisavam chegar cedo ao Centro de Convenções para seus respectivos mini-cursos e oficinas acabavam por perder o horário esperando os ônibus terem número significativo de pessoas para poderem levar o pessoal.

Era fato que os estudantes de outros estados eram os que mais sofriam e nós, pernambucanos, acabamos levando a culpa da desorganização de um evento que foi totalmente montado por uma equipe de fora do estado. O fato do coordenador geral da Bienal ser pernambucano não significou que o grupo responsável pela viabilidade do evento tenha sido daqui.

O descompasso gerado por este processo culminou com a falta de treinamento da equipe de apoio, que quase não sabia de nada; situação idem ocorria no balcão de informação. Um exemplo é que 80% da minha turma de oficina não compareceu a aula final hoje porque foi informada que o curso havia acabado ontem. Ontem acabou o módulo de rádio e hoje seria o módulo de televisão. Havia gente com risco de perder o certificado por erro de informação da produção da Bienal.

Além disso, os eventos eram trocados de lugar na hora em que estavam para acontecer, mostrando que a equipe que alocou as palestras parecia não ter noção de que não importa o assunto, se tiver alguém famoso palestrando o pessoal vai, mesmo deixando o local quinze minutos depois do início do evento. Os atrasos abusaram da paciência de qualquer cidadão. Palestras marcadas para 17:00, começavam às 18:00, 18:30 e terminavam 20:00, 20:30, impossibilitando muitas pessoas interessadas de continuarem até o fim.

Um outro ponto abordado foi o temperamento dos participantes da organização e grupos de apoio. Não eram poucos os estudantes que reclamavam de maus tratos por parte do pessoal do balcão de informação e do grupo de apoio. Hoje mesmo eu fui destratada por um dos seguranças e dois meninos apanharam da equipe de segurança durante a semana. É claro que havia muita gente legal e disposta a resolver qualquer problema, mas a sensação que passou é que o pessoal da Bienal se preocupou mais com a quantidade de pessoas na equipe do que com a qualidade delas.

Sim, claro! Não poderia deixar de comentar aqui um assunto relacionado à qualidade das palestras. Como eu havia citado acima, muitas das palestras fugiram do tema proposto. Na verdade, o que aconteceu é que boa parte dos palestrantes gastou mais seu tempo reclamando dos problemas causados pela era FHC do que tratando dos assuntos em questão. Assustei-me consideravelmente ontem quando o deputado petista Fernando Ferro iniciou sua intervenção, na palestra sobre Democratização dos meios de comunicação, indo diretamente ao assunto e trazendo uma quantidade considerável de informações que era de interesse da platéia. Quase me levantei da cadeira e aplaudi porque nos dias anteriores alguns debatedores usaram o espaço que tinham para dissertar seus currículos pessoais e políticos ou fazer discursos vazios de conteúdo que, logicamente, não acrescentaram nada ao debate.

Foi lamentável ver que, muitas vezes, o tópico da palestra só era abordado pelos componentes das mesas quando questionados pela platéia. Acho que é preciso haver um compromisso da UNE para nas próximas Bienais, em determinados temas, deixar o lado panfletário de lado e chamar especialistas para debater o assunto. Por que de nada adianta chamar representantes legislativos e membros da instituição estudantil para a mesa, quando estes não entendem do que falam e ficam apenas tomando tempo e enchendo os ouvidos do público.

ENQUANTO ISSO, NO PAVILHÃO DO CENTRO DE CONVENÇÕES...

O último debate da Bienal envolvendo o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, o cantor, compositor e jornalista Fred 04 e os músicos Jorge Mautner e Nelson Jacobina foi quase catastrófico. O debate até sairia se não fosse a mania da diretoria da UNE de rasgar seda com todos os partidários que apareceram na hora da palestra.

Para começo de conversa Jorge Mautner e Nelson Jacobina foram praticamente expulsos da mesa para dar lugar ao prefeito do Recife João Paulo, a prefeita de Ouro Preto (MG), Marisa Maria Xavier, e a alguns dirigentes da UNE. Os dois ainda puderam ser vistos no cantinho porque a prefeita de Olinda, Luciana Santos, entrou para cumprimentar o público e saiu logo a seguir. Se ela tivesse juntado-se ao grupo...

Quando isso começou a acontecer, o pessoal na platéia logo começou a desconfiar que a palestra ia ser em grande parte uma troca de elogios e formalidades, como realmente foi. O presidente da UNE, Felipe Maia, disse tantos “queremos agradecer a presença do excelentíssimo...” ou “queremos chamar ao palco o nosso querido...” que já estava dando náuseas.

Depois de todo aquele doce escorrer pelo o palco – o evento seria no Teatro Guararapes, mas como não cabia todo mundo foi transferido para o Pavilhão do Centro de Convenções – finalmente o ministro começou a falar. Na verdade, ele leu um discurso preparado por ele e pelo amigo Hermano Viana, também presente ao evento, sobre a diversidade cultural. O debate seria sobre A Política Cultural no Brasil.

O procedimento era que Gilberto Gil faria suas colocações e estas seriam comentadas por Zero Quatro, Jacobina e Mautner. O que se sucedeu foi inacreditável. As duas únicas pessoas que falaram sobre o tema haviam sido convidadas de última hora para a mesa, um teatrólogo cujo nome não me recordo agora e Marcelo Yuka, que ficou no meio da platéia. Fred 04 respondeu apenas a perguntas sobre a OMB – Ordem dos Músicos do Brasil – e sobre a Indústria Fonográfica. O detalhe aqui é que ele sempre fala sobre isso, então suas considerações sobre estes assuntos já são conhecidas. Jacobina nem sequer teve o direito de falar. Mautner pegou no microfone apenas para pedir a Gil que desse suas considerações a respeito de um episódio de sua carreira há vinte e cinco anos atrás no Amazonas. O prefeito João Paulo falou sobre o discurso do ministro e os demais membros da UNE presentes à mesa sequer falaram.

Quem salvou o debate foi Marcelo Yuka quando questionou o ministro a respeito de projetos e políticas públicas que se antecipem ao chamado para a criminalidade e que evitem que novos talentos desapareçam antes de ter a chance de chegarem ao circuito midiático de grande porte. Se não fosse esta intervenção, a palestra sobre Políticas Públicas no Brasil não ia passar de mais uma cerimônia para cumprir ritual.

NOS BASTIDORES...

*Impressionante como o pessoal bebe nestes eventos estudantis. Havia um stand montado exclusivamente para servir pedacinhos de doce-de-leite, biscoito e cachaça. Gratuito.

*Uma quantidade considerável de bancas e stands vendia livros e revistas abordando assuntos relacionados aos grandes líderes comunistas. Eram biografias, estudos, ficções e publicações de ordem acadêmica. O material era de alta qualidade. Pena que eu estava sem dinheiro...

*O Pessoal da Mostra Literária é quem acabou prejudicado. A mostra não ocorreu no Café Literário como estava previsto e os membros se uniram para protestar antes da palestra de Gilberto Gil. Um garoto subiu ao palco e a organização do evento desligou os microfones. Como ele não conseguiria falar para todo o pavilhão, o grupo criou uma estratégia: ele falaria o discurso em partes e o pessoal que estava sentado na frente iria repetindo o que ele falava em coro para que o pessoal atrás pudesse escutar. Deu certo! Alguns minutos depois a premiação dos vencedores da mostra começou a ser realizada no palco, bem como o lançamento dos Anais Científicos. Porém, a solução achada pela UNE embora tenha conseguido acalmar os ânimos por um tempo, não agradou. As vaias deram seu recado!

*Diversos grupos de teatro e música fizeram do hall do centro de convenções seu palco. Não era raro ver apresentações durante o dia. Pessoas de vários estados puderam mostrar o trabalho que realizam criando espaços alternativos dentro da própria Bienal.

*As oficinas de Grafite e Fotografia também exibiram seus trabalhos no Espaço CUCA hoje. O resultado foi de boa qualidade.