
27 de Março de 1960. D. Carminha deveria estar em trabalho de parto em alguma maternidade do Rio de Janeiro. Ela nem imaginava que o primogênito da família iria influenciar gerações anos mais tarde.
Deram – lhe o nome de Renato. Renato Manfredini Jr. Sempre foi bom aluno e gostava muito de música. Seu avô era flautista e violinista, seu pai também era dado à música, teve aulas de iniciação de piano e costumava ouvir Jazz e Clássicos. D. Carminha costumava acompanhá – lo ao violão e gostava muito de Ângela Maria e de marchinhas de Carnaval. Sua tia, Maria do Socorro, que tomava conta de Renato de quando em vez, ouvia Elvis Presley e Paul Anka.Tamanha diversidade seria influência na vida e obra de Renato Jr.
Em 1968, o Sr. Renato Manfredini foi fazer um curso nos EUA; e a família inteira foi morar em Nova York. Lá, Júnior e Carmem Teresa (sua irmã mais nova) desenvolveram a língua inglesa. Júnior costumava devorar livros em inglês na biblioteca e esse seria mais um “vício” que carregaria consigo o resto da vida.
Ainda nos EUA, ele recebeu um dos presentes que o marcariam demais, o “Álbum Branco” dos Beatles. Renato era completamente apaixonado pela banda, chegou a dizer uma vez que gostaria de ser tão famoso quanto os Beatles. E anos antes de morrer, foi colaborador em um livro sobre a banda.
Na década de 70, em Brasília, a vida de Júnior mudou completamente. Nos primeiros anos na Capital Federal, Renato participou de um Concurso de Arte promovido pela Cultura Inglesa e faturou o prêmio. Diz – se que ele chegou em casa com um pacote de tintas francesas, pegou um exemplar da National Geographic e transformou um dos desenhos da revista em uma tela hiper – realista.
Aos 15 anos, porém, Renato foi vítima de uma doença que dissolveu quase que totalmente a cartilagem que ligava seu osso fêmur ao lado esquerdo da bacia. Passou por duas cirurgias e ficou aproximadamente um ano e meio parado (entre a cama, a cadeira de rodas, muletas e fisioterapia). Em uma entrevista à Revista Capricho, anos depois, ele comentou que a sua auto – estima estava quase zero nesse período, mas mesmo assim, ele aproveitou que mal podia se locomover para ler muito e ouvir música.

Criou uma banda fictícia, a 42th Street Band, e desenhou, inclusive, capas de disco banda, além de outros detalhes, como nome dos integrantes e a história da banda. O nome do vocalista da 42th Street Band era Eric Russell, pseudônimo que Renato usaria para assinar a carta que mandaria ao jornal Melody Maker, na ocasião da morte de Sid Vicious (baixista do Sex Pistols, que ele admirava muito).
Dois anos mais tarde, curado, Renato Manfredini Jr. iniciou seu curso de Jornalismo no Centro Universitário de Brasília. Formou – se, mas nunca foi buscar o diploma. Em 1981 trabalhou no “Jornal da feira”, veículo oficial do Ministério da Agricultura, com o também jornalista Geraldinho Vieira. Ele conta que Renato foi escalado para fazer a cobertura de um escândalo sobre a venda de aves silvestres em uma loja na W3 Norte. Solicitou a entrada de sua matéria no ar imediatamente, foi atendido, e passou quase 2 minutos descrevendo, com emoção cinematográfica, a cena que presenciava, sem chegar no objetivo da matéria (isso no meio jornalístico é considerado como um “assassinato” às regras); porém, o fato não afetou o resultado, e a matéria de Renato alcançou um alto índice de audiência.
Renato também foi chamado por Geraldinho Vieira para fazer um teste para radialista na Planalto FM. No momento do teste anunciou: “Vamos ouvir agora (...) a canção (...)”. Foi contratado na hora. O diretor da Rádio ficou encantado com o locutor que falava canção no lugar de música e não feria os ouvidos da exigente clientela da Planalto FM.
A carreira de jornalista poético e ousado ficou em segundo plano com o estouro da Legião Urbana, no início da década de 80. A partir daí, Renato Manfredini Jr. assumiria o pseudônimo de Renato Russo, e com sua voz marcante, suas letras intimistas ou políticas, românticas ou depressivas, mas acima de qualquer coisa sinceras, mudaria mais uma vez a história do Rock Nacional, junto com Cazuza.
A Legião durou quase 20 anos. Renato costumava escrever sobre o que via, sobre si mesmo e sobre seus amigos. Alguns deles foram personagens de suas músicas. Outros “emprestaram” às letras de Renato os seus acontecimentos cotidianos. Ele dava valor a coisas simples, como os encontros para um cachorro – quente com as crianças na casa de Dado Villa – Lobos ou seus passeios quase diários pela Ilha do Governador, quando voltou a morar no Rio por causa dos compromissos com a banda.

Oito anos antes de Renato falecer, nasceu Giuliano, seu único filho. O menino foi criado pelos avós, devido à conturbada vida de Renato. Em um dos momentos em que falou do filho Renato descreveu o dia em que ao telefonar para a casa dos pais, o filho atendeu e gritou “Mãe, o Júnior no telefone”, e Renato retrucou com algo similar à “Que Júnior o que! Eu sou seu pai”. Mas Renato amava o menino como ninguém, em uma entrevista à Marie Claire, ele falava do garoto como o amor da sua vida. E depois do lançamento de V, decidiu fazer O Descobrimento do Brasil, com linguagem simples para que seu filho e as outras crianças pudessem entender.
Renato Russo é tido como uma espécie de poeta que só aparece a cada vinte anos. Hoje, quase 6 anos após a sua morte, não há sinais de um letrista que venha revolucionar o movimento nacional, como ele fez.