Um mórbido espetáculo...
Primeiro eu visitei o dicionário:
sor.rir
v. 1. Intr. e pron. Rir levemente, sem rumor, com ligeira contração dos músculos faciais. 2. Tr. dir. e tr. ind. Dar, dirigir um sorriso. 3. Tr. ind. Ser favorável. 4. Tr. ind. Dar esperanças; mostrar-se prometedor. 5. Tr. ind. Ser objeto de desejo; atrair, apetecer. 6. Tr. ind. Achar chiste ou graça. 7. Tr. dir. Significar de modo risonho ou agradável à vista.
rir
v. 1. Intr. e pron. Manifestar o riso; assumir expressão de alegria. 2. Intr. e pron. Ter um ar agradável, alegre; sorrir. 3. Tr. ind. e pron. Assumir uma expressão alegre, ter aspecto agradável. 4. Tr. ind. Mostrar afabilidade, aprazimento ou favor. 5. Tr. ind., intr. e pron. Dizer ou dirigir chalaças; escarnecer, gracejar, mofar, ridicularizar. 6. Tr. ind. e pron. Achar graça; desfrutar.Conj.: Pres. do ind.: rio, ris, ri, rimos, rides, riem. Imp.: ri, ride. Pres. do subj.: ria, rias, ria, riamos, riais, riam.
Depois fiquei aqui pensando...
O sorriso é uma das maneiras que encontramos para expressar contentamento, alegria e coisas boas em geral.
O sorriso também é uma forma de defesa; escolhida para disfarçar situações constrangedoras.
O sorriso pode ser usado ainda como uma maneira de debochar do embaraço alheio, e é aqui que ele se transforma em riso.
Quando estudei um pouquinho (apenas um pouquinho) dos primórdios do teatro grego, li que os estudiosos desse tema afirmavam que a comédia era um gênero dramático menor, porque estava associada ao riso. E o riso no teatro, muitas vezes, acontece quando alguma cena bizarra, escatológica ou feia está sendo desenvolvida no palco, ou seja, o riso seria provocado pelo ridículo.
E onde quero chegar...
No começo da semana, uma parcela do Brasil parou para assistir uma cena que envolveu dois dos tipos de sorriso que eu citei acima. O que tenta disfarçar o constrangimento e o que vira riso, em tom de deboche com o embaraço alheio. Umas seis horas da noite, em plena rede nacional, o Programa do Faustão apresentou uma moça, de nome Solange, participante do último Big Brother Brasil cantando We Are The World.
Para quem ainda precisa saber o que aconteceu: durante o confinamento, a garota não sabia a letra e cantava de acordo com o que as palavras em inglês soavam pra ela. A Rede Globo, não contente com os demais micos pagos pela moça ao longo do programa, gravou a cena e simulou um videokê com a letra da música escrita da maneira que era cantada por ela. Os telespectadores vibraram. Risos incontáveis foram distribuídos desde o aparecimento desse espetáculo.
No último domingo, respaldado por toda a produção, Faustão levou a “brincadeirinha” a um nível insuportável, ao fazer a menina cantar errado a música com direito a letrinha do videokê, banda e platéia acompanhando em meio a gargalhadas. O que muita gente achou divertido foi na verdade uma humilhação sem precedentes. Solange não é mais que o retrato de um país que não tem a educação como pauta do dia e ainda prega, diariamente, na mídia, que vale qualquer coisa para conquistar fama e riqueza.
E o que o brasileiro faz diante disso? Ri. Uma produção inteira é montada para fazer a população rir de si mesma. Gargalhar da própria desgraça. Que coisa mais edificante, não? A comédia sendo encenada e a personagem principal estava falsamente confortável no papel! Ela sorria constrangida e todo o resto em volta ria da cena patética em que ela estava inserida. Fico tão indignada com esse tipo de coisa, que me parece absurda a idéia de maquiar a gravidade do problema e “levar na brincadeira”, como algumas pessoas sugeriram.
Se for para relevar tudo e considerar isso entretenimento, então, vamos esquecer, também, as lutas por respeito, dignidade e cidadania. É isso o que se quer? Se não for, então, eu aconselho prestarmos atenção nas nossas ações de sorrir e rir diante da televisão ou qualquer outro veículo midiático. Elas são um bom termômetro para saber se as situações em que estamos envolvidos são benéficas ou mórbidas. A partir daí cada um decide o que fazer. Eu já escolhi o meu caminho.